sábado, 11 de julho de 2009

Nascerão flores

Numa sala de aula a confusão, as picuinhas eram tantas que uma adolescente caiu num choro comovente pedindo à turma que parasse com as encrenquinhas que já estavam estressando a todos. Foi o dia mais comovente de minha vida de professor. Foi gratificante sentir que ainda existe gente com sensibilidade e com coragem de chorar para pedir aos colegas uma atitude mais amorosa em sala de aula.
Percebo o quanto as crianças estão irrequietas, impacientes, nervosas, estressadas. Parecem mini adultos. Parecem absorver, refletir o estresse que vivem os adultos. Preocupante essa constatação. Nossas crianças são precoces em todos os sentidos e não sabem lidar com isso. Sofrem. Perdem todos os limites. Tem poucas referências.
Muitas crianças, a exemplo dos adultos, acabam percebendo apenas o seu quintal, o seu umbigo. Empurram. Querem ganhar tudo no grito. Apelam quando são mais fortes do que as outras. Batem. Impõem as coisas com brutalidade se for preciso.
Crianças doces – não falo aqui de “cordeirinhos” – acabam não tendo vez. Gentileza parece que se distancia a cada dia das relações. Ser gentil é sinônimo de ser bobo, ser boba. Por isso, também para muitos pequenos vale a “esperteza”. Vale tirar vantagem em tudo. Numa sala de aula, atitudes generosas acabam virando deboche.
Por isso, nessa sala de aula, a atitude bonita dessa adolescente, acompanhada por outras atitudes semelhantes de mais algumas meninas e meninos, me comoveram. Percebi que alguns ainda entendem o recado que como professor vamos dando em sala de aula. Alimentou a esperança de mudança de comportamento.
Não é simples trabalhar a idéia da importância de se preocupar com as questões coletivas. Da importância da solidariedade. Da importância de se perceber que vivemos com os outros. Que não estamos sozinhos no mundo. Que enquanto tiver alguém que não esteja bem, devemos fazer de tudo para que esse alguém seja acolhido, cuidado. Não é tão simples trabalhar isso. A tendência é, equivocadamente, cada um se encastelar e esquecer o outro. Só nos lembramos do outro, quando a “água bate na bunda”. Mas quando isso acontece e ninguém vem nos prestar socorro, reclamamos!
Vivemos no universo e temos relação com todos os seres desse mesmo universo. Quando inventamos de pensar que podemos fazer tudo sem considerar nada, nem ninguém, destruímos a natureza, o espaço, desde que isso nos traga vantagem. Esquecemos que nossa vida por aqui é passageira e que outros seres que virão, precisarão de água, ar, verde.
Essa mentalidade de que devemos ser parceiros e parceiras da terra e do universo, precisa urgentemente ser vitalizada, erguida, concretizada. Tudo pode começar também em sala de aula. As crianças ainda perdem muito tempo aprendendo coisas duvidosas, mas ainda não aprenderam, assim como também os adultos, a respeitar o mundo em que vivem. A respeitar aqueles que estão ao seu redor.
Esse choro pode ser semente de mudança nessa sala. Talvez juntando esses belos choros por todos os cantos, a gente comece a mudar muitas coisas.
Paremos! Choremos mais! Pensemos mais no que estamos fazendo de nossas vidas! Quem sabe a gente ainda mexa positivamente na natureza, nas nossas relações. Quem sabe nossas lágrimas semeiem um agora e um amanhã pleno de cor.
As primaveras estão aí. É só a gente acreditar.

Valmir Coelho Ludvig

3 comentários:

Fernanda Albrecht disse...

Lindo texto, Valmir!

Anônimo disse...

"Os poderosos podem matar uma, duas ou três rosas, mas jamais conseguirão deter a primavera inteira".
Che Guevara

Bom dia Amigo Valmir!
Seu belo texto combina com as palavras do Che Guevara.
Obrigada por esculpir na realidade tão "dura" palavras de sentimentos profundos.


Abraço
Fernanda Cabral.

Valmir Ludvig disse...

Fês

Fernanda Albrech - Obrigado por teu comentário. Conheço algumas poesias tuas e se quiseres podes colocar aqui nesse espaço também.

Beijo

Valmir

Fernanda Cabral - Aprendi a vibrar com as pequenas coisas. Isso nos dá força para os momentos mais difíceis.Num jardim, mesmo mal cuidado, sempre tem uma flor que teima em perfumar e colorir esse espaço.

Abraço

Valmir